quarta-feira, setembro 08, 2004

Bipolares alternam grande euforia e depressão profunda

Por María Jesús Ribas
Da EFE

Imagine que numa semana uma pessoa está no paraíso e, na seguinte, no
inferno. Imagine que ela oscila de um extremo ao outro, entre o desânimo e a
exaltação, com intermédios de relativa estabilidade. O maníaco depressivo
sente isso, é como um pêndulo emocional.

"Na fase de depressão, duvidava totalmente da minha capacidade de fazer
alguma coisa bem, sentia que minha mente tinha se tornado mais lenta e tinha
se esgotado a ponto de se tornar praticamente inútil. Não tinha esperanças
em nada e ficava tomado por uma sensação de que nada fazia sentido. Na fase
moderada de euforia, quando estava por cima, minhas idéias eram rápidas e
brilhantes, como estrelas cadentes, minha timidez se evaporava, encontrava
as palavras e gestos adequados para cada situação e as pessoas e coisas eram
interessantes para mim".

"Durante a etapa hipomaníaca, minha sensualidade era penetrante, o desejo de
seduzir e ser seduzido se tornava irresistível, sentia que tudo era fácil.
Quando ficava eufórico, meus pensamentos rápidos se tornavam muito velozes e
se multiplicavam. Uma confusão aflitiva substituía a clareza mental, ficava
irritável e cansado de tudo, me sentia preso. Parecia que todo mundo estava
com o humor contrário ao meu e meus amigos ficavam assustados comigo".

"Com o tempo, compreendi que esse é um problema com muitos pontos em comum
com outras doenças, como o diabetes e a hipertensão arterial, que são
controladas mediante um tratamento médico e para cujo controle é primordial
buscar ajuda quando surgem os primeiros sinais da doença".

Esse testemunho de um doente bipolar, que oscila entre a euforia desmedida e
a depressão profunda, devido à alteração dos mecanismos cerebrais que
regulam seu tom vital, mostra como se sente um afetado pelo "mal dos altos e
baixos": uma desordem mental que afeta de 1,6 a 3 por cento da população.

Bipolares famosos
De escritores como Mark Twain, Herman Melville, Ernest Hemingway e William
Faulkner a músicos como Berlioz, Schumann, Rachmaninov e Tchaikovsky e
gênios da pintura como Van Gogh, Gauguin e Michelangelo, passando pelos
líderes políticos Oliver Cromwell e Winston Churchill, várias personalidades
já tiveram esse problema.

Nessa doença, os mecanismos que controlam o humor da pessoa não funcionam
bem. Ocorrem altos e baixos anímicos exagerados, que podem durar semanas ou
meses, e cuja intensidade, às vezes, torna a internação necessária.

Durante as fases de euforia, a pessoa é hiperativa, tem uma excessiva
autoconfiança, avalia exageradamente sua própria capacidade, se torna
irritável e loquaz e tem idéias delirantes ou de grandeza. Embora para os
outros esteja claro que tal pessoa não está em seu estado normal, ela acha
que tudo está bem.

Nas fases de depressão, por outro lado, ninguém parece entender que a
apatia, a falta de interesse pelas coisas, a lentidão e a fadiga que afetam
o bipolar e que fazem com que as menores obrigações se tornem para ele
obstáculos insolúveis não podem ser solucionadas com alguma distração ou com
força de vontade.

Em ambos os extremos, o afetado tem uma visão alterada da realidade, segue
condutas pouco freqüentes porque vê as coisas de outro modo e sofre a
incompreensão dos que o cercam.

Desequilíbrio bioquímico
Embora nem todas as causas da doença sejam conhecidas, foram estabelecidos
alguns fatores que contribuem para seu desencadeamento, como uma
predisposição hereditária e a existência de circunstâncias vitais geradoras
de muita tensão emocional.

Essa doença pode se apresentar tanto sob formas amenas, nas quais os
sintomas são compatíveis com uma boa adaptação familiar e sociolaboral,
quanto sob formas graves, que incapacitam o doente.

Alguns pacientes têm uma tendência a sofrer recaídas sempre nas mesmas
datas: por exemplo, uma fase depressiva na primavera, uma eufórica no verão
e outra depressiva no outono.

A doença costuma se desenvolver de forma imperceptível na adolescência e
alcança seu auge na fase adulta. Cada recaída torna a pessoa mais vulnerável
ao estresse, por isso alguns doentes podem chegar a ter uma sucessão
ininterrupta de depressão e euforia.Tanto a doença como essa sucessão
ininterrupta são mais freqüentes nas mulheres que acabam de parir.

Embora a doença não seja curada num sentido estrito, ela pode ser mantida
sob sua forma assintomática ou controlada para que a pessoa leve uma vida
normal, embora haja riscos de algumas recaídas.

A doença bipolar costuma ter um prognóstico bom se for tratada corretamente,
mas para indicar o tratamento farmacológico adequado é determinante um
diagnóstico preciso, destacam os especialistas.

Se para um paciente em estado depressivo é prescrito um antidepressivo e ele
é bipolar, podem ser acionados estados agudos de euforia. Por outro lado, se
para um paciente eufórico é receitado um sedativo ou um antimaníaco, ele
pode ter depressão e atitudes suicidas.

Entre um e outro pólo, os pacientes mantêm uma certa estabilidade, por isso
é imprescindível um acompanhamento rigoroso, para a determinação de sua
evolução em conformidade com as diferentes ações terapêuticas e para
previsão da periodicidade dos episódios de euforia e depressão.

Diagnóstico complicado
Para o médico Eduard Vieta, coordenador do Programa de Transtornos Bipolares
do Hospital Clínico de Barcelona (Espanha), "o ponto mais característico da
doença maníaco-depressiva, mas o mais difícil de ser detectado pelo
especialista, é a fase de euforia, uma vez que o paciente não costuma se dar
conta de que tem um problema, já que se sente melhor do que nunca, embora os
que o cercam percebam a situação como anormal".

"Durante essa fase, a pessoa tem pouca necessidade de dormir, se torna
hiperativa, hiper-sociável e irritável. Ela tolera mal os fatos adversos, as
frustrações e que as pessoas a contradigam".

Segundo Vieta, se uma pessoa suspeita for bipolar, deve procurar o médico,
porque a doença tende a se agravar se não for tratada. Embora a psicoterapia
ajude, o fundamental para o tratamento são os medicamentos.

Como a doença bipolar requer que o afetado tome consciência de que necessita
de um tratamento a longo prazo, ainda que se encontre estabilizado, os
grupos de auto-ajuda integrados por pessoas e familiares que atravessam
situações conflituosas similares são decisivos para aliviar e solucionar o
transtorno.

O apoio emocional entre os integrantes desses grupos, a possibilidade de as
pessoas compartilharem experiências e serem compreendidas e a percepção de
elas não são nem únicas nem diferentes do resto da sociedade ajudam muito no
controle da doença.

A informação e a ajuda desses grupos é crucial, sobretudo quando os
primeiros sinais do transtorno aparecem e tanto o paciente como sua família
entram em contato com os serviços de saúde.

Grupos e medicamentos
Além de permitir que o paciente compreenda que pode lidar com sua situação,
que pode recuperar o caminho que achava perdido e que pode se reintegrar à
vida cotidiana, os grupos são essenciais para evitar o atraso na busca de
uma primeira assistência médica e para facilitar o acesso a psiquiatras e
psicólogos aos pacientes que ainda não encontraram uma resposta válida para
seu problema.

"Embora a psicoterapia seja útil como complemento para melhorar as situações
familiares, trabalhistas e sociais que a doença comporta, o tratamento do
transtorno bipolar é basicamente farmacológico", destaca o psiquiatra Eduard
Vieta.

Além do amplo arsenal de medicamentos disponíveis, ao qual sete em cada dez
pacientes respondem favoravelmente, continuamente novos remédios e técnicas
são testados para propiciar o prognóstico da doença, diz Vieta.

O tratamento se baseia numa série de medicamentos destinados a estabilizar o
humor, a controlar os delírios e alucinações da fase eufórica, a sedar ao
paciente e a aliviar a depressão, a ansiedade e a insônia associadas à
doença.

Os fármacos estabilizadores mais utilizados têm lítio na fórmula, um sal que
reforça e aumenta a eficácia dos mecanismos reguladores do estado de ânimo,
impedindo que as oscilações normais do tom vital cheguem a níveis
patológicos.

"A última tendência em psicoterapia, que se soma às técnicas psicanalíticas,
comportamentais e cognitivas, é a psicoeducação, que consiste em ensinar o
paciente a dominar a doença e em dar a ele explicações sobre a medicação e
informações sobre como evitar o estresse, reconhecer a tempo os sintomas
iniciais de uma recaída e melhorar a auto-estima", explica Vieta.

Este texto foi para ilustrar a alguns pacientes algo sobre o assunto e nada impede que busquem outras fontes Ok